Gabriel ficou intrigado desde aquele papo do Renan que
Luxemburgo é o “Oh là là” do momento... O problema é que esse papo de “governo”
ainda está confuso para ele, já que ele atirou já para tantos lados em sua
vida. Em sua adolescência Gabriel era já semi-anárquico, não o anárquico de
entender porque era anárquico e sim, aquele de ligar o foda-se e se mostrar
rebelde porque o mundo era cruel. Então colocava suas calças de skatista, que
não lhe caiam nada bem e tentava fazer manobras radicais com sua bicicleta,
isto é, subir na calçada sem sair da bicicleta. Não votava, e não queria saber
de política.
Com 18 anos entrou para a faculdade de História e tirou a
calça de skatista para se vestir de vermelho, segurar a foice e o machado. Por
quê? Muitas vezes ele, assim como os outros, tentam criar uma história heroica
de seus escolhas, mas a verdade é que ele foi com a maré. Assim como
provavelmente muitos políticos fazem, afinal, trocar tanto de partido não
significa ideologia, e sim “quem dá mais?”. Como diria o camarada Skinner, por trás de
uma história em que a pessoa quer se mostrar digna e heroica, estão sempre
escondidas a falsa noção de causalidade
interior que retira da pessoa, tanto o
crédito para suas ações, como a culpa
por seus erros. Para as pessoas te darem crédito
você deve esconder os passos que te levaram a ser o que é, e deixar parecer
algo espontâneo “eu nasci assim, lindo, rico, inteligente e com o prêmio
Nobel”.
Voltando ao
Gabriel, era isso que parecia para ele. Aqueles colegas revolucionários,
recolhendo assinaturas contra um possível NAFTA incluindo o Brasil,
pareciam ter nascido bolcheviques. E Gabriel sentia que devia vestir o
bonezinho e parecer entendido de Marx desde que nasceu, assim como seus
colegas.
E dali, foi o comunismo, para os partidos mais softcore desses,
porque Gabriel não conseguia ser assim tão radical. Para ser radical precisa de
muito tempo e muita garganta, e ele não tinha esses dois. Então achou que o PT
cairia bem e achou que Lula salvaria o Brasil.
Muito ele se esqueceu que antes dele havia uma história. E
que o momento que ele vivia não era mais importante do que tudo que já
aconteceu. Que na Europa o comunismo já era piada (menos na França) e que o
comunismo é o horror para a maioria dos europeus que o viveram. A maioria das
ideologias de governo foram instaladas com ditadura, porque a maioria delas não
acredita ser possível um acordo entre as pessoas. Pior, elas tem a convicção
que o único meio de salvar algo é por meio delas.
A experiência de Renan na Polônia e na parte da Alemanha que
viveu o comunismo marcou Gabriel, pois ele foi visitá-lo algumas vezes. Ele voltou, então, à era anárquica, mas dessa vez foi
atrás do que era isso...
A ideia de que um governo vai fazer um país eliminar
pobreza, analfabetismo, doenças, etc. etc. sempre o foi duvidosa. Um governo
realmente surgiu para isso? Talvez essa foi a melhor propaganda criada por uma
instituição. Pois ela faz parte do povo acreditar que sim, há milênios. Apesar de
pagarmos impostos para guerras, para festas que não podemos participar,
propriedades suntuosas que nunca poderemos entrar, políticas falidas, cortes de
cabelos de 3000 reais, e para reuniões onde o produto delas é a fala e nada de
produtivo, ainda acreditamos que o mal está nas grandes corporações.
As grandes corporações só podem produzir o mal se estão
acobertadas por governos corruptos. Algo que representa isso muito bem é Atlas Shrugged. Os governos fizeram muitos acreditarem que o que destrói o mundo são as
grandes corporações. Sendo que é o próprio governo que está por trás da
manutenção dos piores defeitos delas. Sem o apoio do governo, as más
corporações faliriam, pois as pessoas buscam qualidade e deixam de procurar,
comprar e usar aquilo que faz mal para elas. Às vezes é um processo lento. Mas
elas os fazem. Pelo menos é nisso que um anarquista acredita. No poder de
observação e mudança das pessoas, no voluntarismo e na liberdade delas. Foi a
maior sacada da história isso de fazer crer que o que um governo faz é pelo bem
comum. Deixa-se de olhar para aquele que retira do povo o que quer e o cria
impostos para aquilo que deixa para trás.
O pior então é crer que o que salva um país é a mudança de
pessoa de um posto político. Mesmo que ela tenha as melhores intenções, e que
ela consiga mudar coisas, ainda vai ser pontual. Pois o sistema é falido. O
ambiente político não gera produtividade, ele gera estagnação, falas e mais
falas, discursos e mudanças a curto prazo, já que alguém fica no posto por 4
anos e em geral essas pessoas tem como objetivo fazer coisas que pareçam
“soluções” para poder depois se elegerem de novo. O que fazem de bem é só um
meio para outro fim. O de manter-se no posto. Um posto que recebe mais
benefícios sem fazer muita coisa mais do que qualquer outra profissão.
Gabriel pensa que Luxemburgo não é um país rico porque seu
governo é “bom”. Seu governo é mais livre, menos burocrático, as pessoas tem
mais poder de decidirem sobre a economia do país. Mesmo tendo muitos bancos que
provavelmente são paraísos fiscais de políticos corruptos, quem há de decidir
sobre a moralidade desses bancos não é o governo luxemburguês. Os políticos
corruptos não vão parar de corromperem porque não tem um banco para colocarem
seus dinheiros. O sistema simplesmente não acaba fácil dessa maneira.
Essas histórias são vários capítulos da vida de Gabriel, o
ceticismo em relação a governos nem mesmo começou. Mas os dados impressionam.
Os países mais livres de intervenção estatal são os mais ricos (não ricos
somente em dinheiro, e sim em saúde, educação, bem-estar, etc.). Aí está a
lista...
Gabriel volta seus olhos para o café e está todo mundo
triste, deprimido e desanimado. Ele sabe que seus amigos não tem o que fazer. São
obrigados a pagar impostos mesmo sendo contra a maioria do que assistem
diariamente os políticos fazendo. Mas o estado é o único que tem o poder de
coerção. O café da Je não pode contribuir somente para aquilo que acreditam que
vai funcionar. Eles nem são questionados a participarem das decisões, apesar de
os políticos tentarem parecer que são. Que no que eles votam (se votam) são na
lista de promessas. E essas promessas são as soluções, mesmo que elas não sejam
compridas, são lindas.
Jerusa propõe um brigadeiro para animar o povo. Aqueles que
nasceram com uma máquina de queimar lipídios potente aceitam, aqueles que têm que
correr 3 horas para eliminar uma mordidinha recusam. Assim eles agradecem a
liberdade de escolha daquele momento. Sendo liberdade não o “fazer o que dá na
telha” e sim a existência de controles menos
aversivos como a ameaça de punição,
e sim, mais positivos que as pessoas livremente acordam em recebê-los em suas vidas. Não bater no filho porque ele não
fez a tarefa de casa, mas sim ensiná-lo a gostar de estudar e ser curioso com a
vida. No primeiro o resultado é óbvio, alguém que se comporta por regras –
fazer para não apanhar. E não aprende porque faz e o que resulta do seu fazer.
No segundo, ninguém sabe, mas provavelmente alguém que fará o que gosta e verá
os estudos como um meio de sempre questionar a existência das coisas.
Há aqueles que acreditem que a situação só muda quebrando um
governo, tirando o máximo de dinheiro deles e não pagando impostos.
E você, acredita que é o seu governo (as
pessoas que estão nele, seja as com boas ou más intenções) que vai mudar aquilo
que está prejudicando o seu país?
Gabriel
Cíntia,
ResponderExcluirParabéns pelo post! Esse é o melhor de todos pra mim! Viajei com a trajetória e gostei muito da reflexão acerca do sistema que é falido. Isso me lembrou minhas aulas sobre biopolítica na UFSC com um professor de filosofia que é uma referência. Uma vez numa aula discutimos o livro de Foucault, Segurança, Território e População em que o autor descreve sobre essa moral que possuímos de acreditar num "pastor" que cuidará de nós. Vale a pena ler este livro porque vai ao encontro das tuas ideias. Ao final da discussão o professor levantou essa questão para discutirmos... pq a todo momento precisamos de um pai da nação para nos proteger? por que nos não começamos alguma mudança? e por que não paramos de acreditar que a educação é a redentora de todos os problemas? enfim... são questões para longos debates!
Bjoooo e parabéns! belíssima escrita!
Oi Gra!
ResponderExcluirObrigada pelas dicas! E pelas perguntas! Alias, boas perguntas!