O que eu não imaginava
que encontraria pelas bandas do Grão-Ducado era um escritor brasileiro. Muito
menos que ganharia das mãos dele e de sua mulher seu livro.
Eu até achei que a
profissão escritor tinha entrado em extinção no Brasil. Que literatura boa,
curiosa e interessante, eu tinha lido na escola e era basicamente isso. Pode
ser também que fiquei perdida no tempo e desatualizada da literatura atual
brasileira.
Mas o Brasil ainda guarda muitas surpresas. Uma delas é o livro Tabua, de Carlos Tourinho de Abreu.
Mas o Brasil ainda guarda muitas surpresas. Uma delas é o livro Tabua, de Carlos Tourinho de Abreu.
Já nas primeiras
páginas senti que teria que ler até o final do livro para saciar minha
curiosidade do que se passaria com o personagem principal da história.
O livro começa no sertão
nordestino, Bahia. Nossa querida Bahia, que muito já proporcionou ao Brasil.
Uma história particular, mas comum. Menino pobre, que sofre da fome, da violência
e da dúvida de qual futuro terá.
Desde o inicio, como
leitora, eu me apeguei a esse menino, torcia por ele e queria muito, mas muito,
saber quem ele encontraria em sua vida, como as pessoas lidariam com ele, que
ensinamentos lhe passariam. Do sertão da Bahia, Guina passa por Serra Pelada, São
Paulo, litoral baiano e chega até aos Estados Unidos. Conhece pessoas e
entidades que nunca imaginei que poderiam ser ou existir. Apaixona-se e deixa o
leitor esperançoso desse amor. Procura o tão desejado ouro, e a tão essencial
saciedade.
O que gosto também do
livro é que as descrições de cenas e personagens são na dose certa. Deixa o
leitor imaginar um pouco, inventar um rosto, um ambiente para as cenas. A
possibilidade de poder imaginar na leitura, talvez seja um dos requisitos para
um livro ser considerado bom.
No meu caso, uma dose
de suspense também é muito importante. E Tabua
tem isso de “vou ler só mais uma página para ver o que acontece”. E lá se vão algumas
páginas! Da mesma forma, o fato de Guina passar por muitos lugares do
Brasil dá um sentimento de qualquer brasileiro se sentir pertencente e
contemplado na história.
Não quero contar
detalhes da história, porque vocês mesmos leitores tem que querer redescobrir
esse mundo da literatura brasileira. Gostaria muito de poder incentivar a
leitura de uma maneira mais eficaz, mas a única que conheço é por indicação. Então
aí vai: eu indico o livro Tabua, do
escritor baiano-brasileiro-luxemburguês, Carlos Tourinho de Abreu.
Como o autor está bem
pertinho de mim, eu resolvi fazer uma entrevista com ele, que digamos assim, me
surpreendeu novamente. Dei uma de jornalista e funcionou!
Olhem aí a entrevista
com o autor:
1 – Carlos, você poderia me contar de onde “tirou” sua
inspiração para contar essa história que atravessa o Brasil inteiro?
Tanto Tabua quanto Ventos para Areia Branca, meu novo
livro, são livros que os personagens principais viajam pelo Brasil inteiro, e
até por outros países do mundo. A minha ideia foi dar ritmo à trama e, além
disso, cada lugar tem uma importância especial para a que o desfecho dos livros
façam sentido. No entanto, o foco de ambos os livros é no Nordeste brasileiro,
mais especificamente no interior da Bahia, Estado onde nasci. Muitas das
locações dos livros existem, e apesar de ambas as histórias serem ficção, me
inspirei em traços culturais e pessoas reais. Criar personagens é como um
quebra cabeça, no qual algumas peças são características de pessoas que algum
dia conheci.
2 – Quando você sentiu pela primeira vez na sua vida
que queria ser escritor?
Desde pequeno escrevia poesia, apesar de achar que
elas não sejam nada demais. Interessei-me em escrever ficção, pois queria muito
escrever uma saga medieval, pois me interessava e ainda muito me interesso pelo
assunto. Por sinal, este foi o primeiro livro que escrevi, e chama-se
Horizontes Medievais – ainda não publicado. Comecei a escrevê-lo em 2003, parei
alguns anos e retomei em 2007. O livro é muito bom, grande, por isso acho que
pode ser dividido em três volumes, e devo revisitá-lo para alguns ajustes. Sabe
como é, acho que adquiri alguma experiência com os dois livros que publiquei e
sem dúvida posso melhorar um pouco Horizontes Medievais. Entretanto, falta-me
tempo para me dedicar a este projeto.
3 – Como é ser
um escritor brasileiro no início desse século XXI?
Difícil, pois
há pouco apoio tanto das entidades governamentais quanto do mercado editorial -
que vive uma época de incerteza em relação aos rumos que a comercialização de
livros vai tomar. A Amazon é um ótimo exemplo que quebra de paradigmas no que
se refere à comercialização de livros no século XXI. A primeira edição de Tabua
foi publicada em uma editora convencional. Apesar de no início ter vendido bem,
EU e somente EU fui o responsável por promover o meu livro – através de redes
sociais e blog. Apesar do esforço colossal da minha parte, tive quase nenhum
retorno financeiro - o direito autoral é ridículo -, e posso dizer que lidei
com muitos entraves de logísticas, pois apesar de muitas promessas por parte da
editora, os leitores não encontravam Tabua nas prateleiras das livrarias da
maior parte do Brasil. Resolvi então publicar Ventos para Areia Branca pela
Amazon e Clube de Autores (um site de auto publicação brasileiro). Sucesso
total! Disponível online para todo o Brasil e diversos países do mundo. Sucesso
de vendas! Recebo direitos autorais sem intermediários e todos os meses.
Chequei até a ser o campeão de um prêmio literário com Ventos para Areia
Branca. A experiência foi tão boa que decidi rescindir antecipadamente o
contrato de Tabua com a editora convencional e no fim de 2014 publiquei a sua
segunda edição pela Amazon e Clube de Autores.
4 – É possível viver só da profissão escritor?
Acho difícil. A
não ser os puxas-saco do governo, que vivem miseravelmente de editais, acho
muito complicado se tornar um fenômeno de vendas como Paulo Coelho, por
exemplo. No Brasil ainda há aquela ideia idiota de que se o livro vende bem,
não tem qualidade literária. Visão muito diferente de mercados evoluídos como o
americano e o europeu.
5 – Você o faria se fosse possível?
Faria! Amo
escrever e acho que através da escrita posso fazer alguma diferença. Hoje não
tenho tanto tempo para escrever, pois a vida corrida da minha profissão – a que
ganho o pão de cada dia :) - não me deixa ter a paz de espirito para me dedicar
a novos projetos literários. E olhe que tenho muitos em mente!
6 – Você acha que o brasileiro lê bastante? Caso não,
por que acha que não?
Lê muito pouco,
comparado a mercados literários mais maduros. Posso dar um exemplo prático.
Meus livros vendem a mesma quantidade em média nos Estados Unidos e no Brasil.
Aí você me pergunta: quem compra seus livros nos Estados Unidos, se ele é
escrito em português? Eu respondo: provavelmente brasileiros vivendo nos
Estados Unidos, e que incorporaram o hábito da leitura do país que migraram. É
impressionante o dinamismo do mercado literário americano. Os números são
incomparáveis com o Brasil. Acho que o povo brasileiro lê pouco, e muito desse
fenômeno é explicado pela péssima educação que é destinada aos jovens
brasileiros. Muitos dos nossos potenciais leitores são diagnosticados
frequentemente como analfabetos funcionais. Uma pena!
7 – Houve uma época que existiam muitos escritores
brasileiros, fim do século XIX, até meados do século XX. O que você acha que
tinha de especial nessa época que as pessoas se sentiam inspiradas a escrever?
Vamos focar no século XX, pois está mais perto de nós.
Não precisa ir longe, meus dois conterrâneos, Jorge Amado e João Ubaldo
Ribeiro. Sucesso nacional e internacional. Lidos em diversas línguas.
Formadores de opinião e participantes ativos da mídia da sua época. Se há
público, investimento na imagem do autor, reconhecimento, remuneração do seu
trabalho, sem dúvida há inspiração para escrever grandes obras como Mar Morto e
O Sorriso do Lagarto.
8 – O que mudou?
Acho que o foco da mídia é muito importante neste
contexto. Hoje a concorrência é imensa por um lugar aos holofotes. Para as
grandes redes de TV e rádio, vale mais falar de funk, Valesca Popozuda,
Arrocha, e etc. Por que? Porque atinge uma massa pouco erudita, que mesmo
extremamente endividada, hoje em dia tem certo poder aquisitivo. No passado não
tinha. Daí havia mais espaço para escritores, bons músicos, como os da Bossa
Nova, que vendiam para um público mais culto. As editoras e gravadoras
investiam pesado nos seus artistas, de modo que havia retorno. Infelizmente, os
grandes nomes da literatura brasileira estão morrendo, e não há sequer um nome
da nova geração que podemos chamar de ídolos, nos moldes dos escritores da
velha guarda.
9 – Você acha que o uso constante de redes sociais
diminuiu o tempo que as pessoas passam em leituras? O que mais você acha que
contribuiu para as pessoas estarem lendo menos?
As redes sociais são grandes parceiras para autores
“ilustres desconhecidos” como eu. Sem elas eu não teria nenhum canal para
divulgar meu trabalho. Não acho que elas sejam as vilãs no quesito “falta de
leitura”. O mundo de hoje é muito dinâmico e corrido. Muitas pessoas já me
relataram que depois de um dia de trabalho exaustivo, querem chegar em casa e
assistir algo idiota na TV. Algo que não tenha que pensar muito. Além disso, há
concorrentes fortes, como: youtube, netflix, videogame, etc e etc. No entanto,
ainda acho que uma boa leitura nos leva a caminhos que nenhum outro meio pode
nos levar. Nossa imaginação cria um mundo ideal e nada ainda pode substituir
esta sensação.
10 – Por último, o que você acha que deve ser feito
para as pessoas lerem mais? Principalmente, mais literatura brasileira.
Primeiro, uma revolução radical no sistema educacional
brasileiro. Precisamos reagir a uma realidade onde o bom ensino agoniza.
Investimentos consistentes e eficientes são fundamentais. Pessoas educadas são
estimuladas a ler. E melhor, tomam gosto pela leitura e passam o hábito para as
gerações seguintes. Segundo, o livro tem que ser mais barato no Brasil. Mais
isto é muito relacionado aos poucos ganhos de escala do mercado editorial
brasileiro. Se tivermos mais leitores, o custo do livro cairá
proporcionalmente. Com essas duas medidas, acho que já haveria um bom estímulo
para o fomento da literatura nacional, que hoje fica nos fundos das prateleiras
das livrarias, atrás das traduções estrangeiras. Um mero reflexo de um modelo
de negócio próspero que vem de fora. Os mercados americano e europeu funcionam.
Era impressionante quando pegava o metrô na Inglaterra – na época em que lá
vivi – e observava a enorme quantidade de pessoas com os rostos grudados em
livros – tanto impressos, quanto ebooks. Ficaria imensamente feliz se chegasse
a ver isso algum dia acontecer no Brasil.
Para saber onde encontrar os meus livros, clique aqui:
Leia os primeiros capítulos de Tabua e Ventos para
Areia Branca, aqui:
Mais informações sobre o autor:
ps: Agora eu entendi bem o que essa capa representa :)
Desejo uma boa leitura
para vocês! Assim como foi para mim.
Cíntia