O SUS é
um sistema de saúde público, gratuito para todos brasileiros, residentes e até
mesmo nossos amigos turistas. Foi instituído em 1988, como um direito de todos
e dever do Estado cuidar e promover saúde no Brasil.
Apesar da
gratuidade e universalidade do SUS não são todos brasileiros que o usam. Alias, muitos políticos não usam. No
Brasil além do sistema público de saúde existem vários sistemas privados.
Eu não
lembro na minha infância, mas na minha vida adolescente-adulta foram poucas
vezes que usei o SUS. Usei principalmente a emergência do Hospital
Universitário da Federal de Santa Catarina e uma vez doei sangue lá. No mais,
sempre usei sistemas privados de saúde.
Aqui em
Luxemburgo temos a CNS, que é a Caixa Nacional de Saúde, ela paga todo o tratamento na área de saúde. Todos os médicos e hospitais são privados ou entidades particulares. Então você vai lá, paga e depois manda para a CNS o recibo e ela reembolsa de 80-90% em média. Em geral, posso dizer que estou satisfeita com o sistema de saúde de Luxemburgo. Não demoro muito para conseguir consultas, ou é no mesmo
dia, ou tenho que esperar no máximo 3 semanas. Eu pago na hora a consulta, mando o recibo para a CNS e em poucos dias recebo o reembolso na minha conta bancária pessoal.
O parto do meu filho foi
realizado num ótimo hospital, muito moderno, limpo e com bons profissionais.
Tive assistência de uma doula até um mês depois que o Benjamin nasceu. A única
coisa que me incomoda um pouco é a demora para o Benjamin ser atendido no Hospital
Infantil. Já cheguei a esperar quase 3 horas, mas o atendimento foi bom.
Principalmente quando são crianças. Com elas o negócio é levado muito a sério!
Não importa se é só chilique de mãe. Qualquer tosse do bebê vai ser levada em
consideração.
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Corredor do Hospital Infantil Kannerklinik em Luxemburgo |
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Kannerklinik, UTI |
Link CNS:
Link Maternidade:
Link Hospital Infantil:
Quando
fomos viajar ao Brasil, nos informamos que qualquer médico que precisássemos lá
poderíamos pagar e depois a CNS nos reembolsaria. Então não paguei nenhum plano
privado.
Como o
Benjamin é bebê, ele não escapou de ter uma febre aqui e acolá. Um dia que a
febre ficou muito alta, resolvemos o levar no hospital mais perto da casa dos meus pais, o Hospital Universitário da UFSC.
No
caminho eu já fiquei ansiosa, imaginando a cena de muitas crianças
doentes, na fila, tossindo, horas esperando e que seríamos mal atendidos. Bem o
contrário! Chegamos lá pelas 7h e não havia ninguém na sala de espera. Pediram
para eu abrir uma ficha para o Benjamin no plantão, eu fui lá e entreguei o
passaporte dele tremendo pelo medo de ouvir “o sistema não aceita o passaporte
alemão”. Eu tenho pavor do sistema... Ele é um pé no saco e aparentemente
ninguém sabe quem o fez, porque humanos não conseguem mudar o sistema.
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Único sistema que funciona |
Pelo
contrário, novamente fizeram bem rápido e o Ben foi encaminhado para o plantão
infantil.
Lá, uma
enfermeira muito simpática puxou papo com nós, pesou o Benjamin, brincou com
ele, o Ben jogou seu charme para ela e logo um aluno do doutorado em Medicina
nos atendeu. Muito preocupado, examinou o Benjamin todo e depois chamou a
médica para ter certeza do seu diagnóstico. Os dois foram muito simpáticos, se
apresentaram, nos trataram muito bem e depois de vários exames, alguns que fez
o Ben perder seu charme, falaram que provavelmente seria um resfriado mais
forte.
Sem
contar que mãe sempre está preocupada com a saúde de seu filho e que já várias
vezes fui ao médico e recebi o mesmo diagnóstico que eu e o Dani fizemos,
gostei da experiência no HU.
Somente
as condições físicas do hospital me deixaram bastante chocada. Pisos e cadeiras quebradas,
banheiro sujo, goteiras na sala de exame,
paredes rachadas, quase nada de isolamento entre as paredes, em geral muito mal
cuidada, antiga e mal construída essa parte do plantão infantil.
Saímos de lá, fomos ao postinho de saúde do Itacorubi, entreguei a receita médica para a pessoa que estava na recepção. Quando ela viu que ele era alemão, começou a falar do sistema, mas mal deu tempo. Um crítico do sistema apareceu, pegou a receita da mão dela e logo me mostrou onde eu poderia pegar a medicação. Ufa! Ainda tem gente que sabe que o sistema é feito por humanos! Viva o Postinho do Itacorubi!
Cheguei
em casa, e fui curiosa pesquisar na internet se era uma experiência única ou universal.
Em pesquisa realizada pelo Datafolha a pedido do Conselho Federal de Medicina
(CFM) e divulgada em 19 de agosto de 2014, 87%
dos usuários entrevistados reprovam o SUS. Provavelmente isso muda de
estado para estado. Também não sei o quanto o Data Folha é confiável, mas foi a
única estatística que achei referente a esse tema (alias, alguém conhece uma melhor?). Link aqui.
Por que
seria tão alta a reprovação do SUS (sem ser o óbvio que lemos nos nossos jornais diariamente)? Quais são as consequências a curto e longo
prazo de deixar nas mãos do governo os cuidados com a saúde?
Para
entender melhor o sistema de saúde socializado, eu escolhi um texto para compartilhar com vocês, que considero o mais
explicativos dentre os que encontrei. Foi escrito por Davi Lyra Leite, doutorando
em Engenharia Biomédica na Universidade do Sul da Califórnia e formado em
Engenharia Elétrica pela Universidade de Brasília. Aqui está o link do texto
completo:
E aqui vão as principais considerações de Davi (com algumas modificações minhas,
pois o texto é muito longo) sobre os prós e contras do sistema de saúde
socializado:
O grande pró deste sistema encontra-se
no fato de que as pessoas não precisam desembolsar diretamente o dinheiro para
ter acesso ao sistema de saúde, já estando cobertas quando de qualquer
necessidade. Então, não precisam economizar ou ter logo muito dinheiro quando
precisam fazer um procedimento médico que custa muito caro. Além disso, os ricos
e pobres têm acesso aos mesmos tipos de médicos. Teoricamente a seleção para
tratamento se baseia em critérios como ordem de chegada ou gravidade da doença.
O financiamento desse sistema pode se
dar basicamente de duas formas:
- Contribuição igualitária individual, em
que cada pessoa paga um valor fixo para o Estado por ano, e o governo
aloca os recursos conforme achar necessário. Seria algo similar a um plano
de saúde estatal.
- Pagamento através de impostos, sendo
mais ou menos progressivos conforme o país. Esses impostos podem estar
sobre a renda, o consumo ou a propriedade. Sendo essa a forma de financiamento do SUS.
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O problema de sonegar impostos é um argumento ético. Um dos
argumentos padrão é, a quem pertence esse dinheiro? |
Assim, o clamor de que os ricos pagam
pelos pobres não é necessariamente factual, visto que um pobre saudável que não
use o sistema de saúde financiará um rico doente. Nesse modelo, os custos são
divididos por toda a sociedade e a lógica de transferência de renda é feita dos
saudáveis para os doentes.
Recursos são alocados segundo um
planejamento estatal, com pouca participação do mercado, seja na definição de
preços, seja no fornecimento de serviços concorrentes. Um burocrata define
quantos e quais profissionais são necessários para cada grupo de habitantes, e
faz as compras de suprimentos conforme modelos econômicos que ache razoáveis. Até
existem conselhos comunitários de saúde, mas as decisões são em si estatais.
Licitações são usadas para definir o
preço de um produto — e não a sua qualidade ou real necessidade futura. Muitas
vezes, dado o processo lento e não coerente com o mercado, há falta de material
cirúrgico-hospitalar, medicamentos e assim por diante. Esse
contexto incentiva o crescimento do mercado negro, onde medicamentos são
revendidos e pessoas conseguem ter acesso a serviços não ofertados pelo
governo.
Como os burocratas não precisam
assumir os custos de suas más decisões, visto que muitas vezes permanecem no
cargo mesmo depois de várias escolhas erradas, há pouco incentivo interno para
melhorias. Além disso, o público paga pelo serviço independe do seu uso e da
sua qualidade, o que leva a custos desconexos com a realidade, corrupção,
tráfico de influência e cartelização impostas pelo mecanismo de planejamento
central. Inovações tecnológicas demoram a ser adotadas e o ambiente não cria
incentivos para investimentos privados diretos, visto que há restrição
governamental para entrada no mercado.
No longo prazo, o resultado de todo
sistema socializado de saúde é o racionamento do atendimento, com longas filas
se formando e com tempo de espera significativo. Em muitos casos, as pessoas
chegam a morrer esperando pela sua vez, enquanto os mais ricos conseguem fugir do
sistema pagando por fora para médicos ou viajando para outros países a fim de
conseguir seu atendimento médico .
O desequilíbrio de oferta ou preços
dura pouco tempo e em alguns anos a escassez começa devido a contenção de
gastos governamentais e a incapacidade da oferta atender a uma demanda sempre
crescente, visto que o preço monetário do serviço será artificialmente definido
como zero.
Assim, um país como a Suécia, ou até Luxemburgo, que
apresenta uma população pequena, amplamente urbana e muito homogênea, consegue
implementar um modelo socializado de medicina, levando anos até que ele comece
a apresentar fadiga. Enquanto isso, o SUS brasileiro é problemático desde sua implementação.
O mesmo vale quando comparamos os sistemas baseados em seguro obrigatório
individual, que funcionam muito bem na Suíça, mas apresentam vários problemas
em estados americanos, como Massachusetts. Assim, alegar que algo é muito bom e
que vai dar certo se implementado no nosso país porque parece funcionar em
outro país não é um caminho razoável.
Se
quiserem ler mais sobre o sistema de saúde misto e o de livre-mercado, aqui vai
o link.
Enquanto
isso, alguns profissionais do SUS tentam de todas as formas dar o melhor de si, apesar de todos problemas que vivenciam... E o Benjamin e seus amiguinhos continuam a ter suas febres inexplicáveis.
Para qualquer tipo de sistema de saúde, as febres infantis sem outros sintomas são
ainda um mistério a se desvendar. Ainda bem que assim como elas vem, elas vão!
Cíntia