Quando o
prédio da Universidade em que trabalho se mudou para o sul de Luxemburgo:
Abalou
Bangu entre os funcionários!
Não por
menos... Nós temos muita dificuldade de mudar nossas rotinas e não seria
qualquer mudança. Por exemplo, no meu caso, eu morava a 10 minutos de bicicleta
da Universidade, e quando a Universidade se mudou para Belval eu passei a
precisar de 1h20 de transporte público para chegar lá! Transporte público em
Luxemburgo daria um próprio post...
A mudança
em si foi complicada para muitos funcionários. Mas o que mais pegou para muitos
não foi somente a mudança, foi à ida para o “sul” de Luxemburgo, o tão temido
sul... Cheio de estrangeiros, cheio de portugueses! Inclusive portugueses me
falavam isso.
Sim, o
que eu mais ouvia, era “você vai para o sul? Ai sério? Por quê? Não faça isso.
Não vá para Esch-sur-Alzette!” Bem para onde fui.
Outro
problema de Esch era a “criminalidade”. “É no sul que acontecem a maior parte
dos crimes”.
Primeiro
vamos ser claro em um ponto... “Crime” em Luxemburgo é principalmente “roubo a
casas quando elas não estão ocupadas”. Ok, alguém entrar na minha casa e levar
meus móveis second-hand ou no máximo minha televisão e não me encher o saco, Não
apontar uma arma para minha cara? Ok, com esse risco posso viver.
Mas ainda
fiquei com a pulga atrás da orelha e pesquisei no site da polícia de Luxemburgo sobre
criminalidade em Esch-sur-Alzette. Resultado? O maior índice de crimes acontece
na capital, Luxemburgo: 23% de todos os crimes do país. Em Esch são 6% e no
resto do país 4%... Ok, eu consigo conviver com 2% a mais de criminalidade...
Se considerar que antes eu morava na capital, eu moro hoje numa cidade muito
mais segura.
De acordo
com o relatório da OSAC em Luxemburgo “Violent crimes (homicide, aggravated
assault, sexual assault) are uncommon” (Crimes violentos - homicídio, assalto, agressão sexual - são incomuns). As últimas estatísticas publicadas pela
polícia luxemburguesa contam com um assassinato em 2013, por exemplo.
Aí fui
mais longe... Pesquisei sobre criminalidade e regiões do país... Agora olhem
para esse mapa... Me parece que o sul é tão mais perigoso que o norte?
Como
vocês podem ver, a taxa de criminalidade no sul não é tão diferente da do
norte. Sendo a capital a cidade com a maior taxa, não estranhamente, já que
também tem a maior população do país. Mas Esch, a segunda maior cidade do país,
é tão “criminosa” como algumas vilazinhas do norte e do nordeste. Obviamente,
as cidades nas fronteiras tem maior índice de criminalidade. Nossos amigos
ladrões alemães, franceses e belgas se interessam pelos móveis e
eletrodomésticos luxemburgueses, apesar de que os “burgueses” os compram
exatamente nesses países.
Luxemburgo
é o vigésimo país do mundo com menor índice de homicídios de acordo com a United
Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). O Brasil fica em 201 de 218 países.
Bom, mas
porque estou falando de tantas estatísticas? Principalmente porque elas dão um
pequeno alívio e “prova” do que realmente acontece em Esch-sur-Alzette: nada de
grave.
A questão
é, por que tantas pessoas vieram me alertar? Por que tantas pessoas tem
preconceito com o sul de Luxemburgo? Porque se eu fosse para Differdange, Dudelange,
Mondercange, etc, eu ouviria as mesmas coisas...
Provavelmente
é uma questão histórica. O sul de Luxemburgo era onde (e em partes ainda é) se encontravam as grandes indústrias de metal e de mineração. E quem trabalhava nelas? Os
estrangeiros, principalmente os portugueses. Muitos homens portugueses deixavam
suas famílias em Portugal e vinham trabalhar nas indústrias e morar em cima de
“Cafés”. Café é tipo um restaurante-bar que praticamente fica aberto o dia
inteiro. Dá para tomar lá um café da manhã, mas também uma cerveja depois do
trabalho.
Imagine
como uma situação dessas – ficar longe da família, viver só, num quarto,
trabalhando em indústria metalúrgica, com o clima e a cultura totalmente
diferente do seu país de origem... Não é claro que isso te desestabilizaria?
Mas logo veio a lei de “reagrupamento familiar” e os portugueses procuraram
pelo país de Luxemburgo locais mais baratos para construírem casas. Logo, os
portugueses se espalharam pelo país inteiro.
Então, lá
fomos nós para Esch. E o que encontramos lá?
Muitos
parques naturais e parquinhos lindos para o Ben brincar e fazermos trilhas:
Uma
churrascaria portuguesa deliciosa, mas para aqueles que não comem carne,
encontra-se também a melhor broa da redondeza. Olha aí o desespero para comer a
broa.
Um
restaurante delicioso, de um casal, italiano e brasileira, que viraram amigos.
Uma linda
feira de Natal e um calçadão gigantes para os fãs de compras:
Uma
padaria luxemburguesa tradicional que tem os melhores pães que já comi de Luxemburgo:
Uma piscina municipal:
Crianças jogando futebol na rua:
A Universidade de Luxemburgo, cheia de atrações para aqueles que ainda não a estão cursando.
Creches
com 3 educadoras para 11 crianças. Em Luxemburgo é 2 para 12.
Em
Luxemburgo, eu me tornei uma grande amiga da minha vizinha luxemburguesa. Nós
adorávamos deixar docinhos na porta uma da outra, para quando abríssemos a
porta, voilá, surpresinha. Quando o Ben nasceu, ela começou a deixar morangos.
Quando passamos a frequentar a casa uma da outra e termos conversas mais
íntimas, ela começou a falar da quantidade enorme de estrangeiros que tinha seu
país. Contava dos velhos tempos, em que quase não havia estrangeiros. Me levou
para um restaurante tradicional luxemburguês, porque aquele era bom, já que
quase não iam estrangeiros. Eu me perguntava se apesar da minha pele morena e
minha brasilidade, ela não me considerava uma estrangeira. Talvez o fato de
que conversávamos em alemão, a fazia esquecer disso.
Agora
penso que ela provavelmente reproduz um discurso que começou lá na infância, e
ela mal nota que na verdade, ela não tem preconceito com estrangeiros... Ela só
fala aquilo, porque provavelmente muitas pessoas de seu círculo social falam.
Se ela tivesse, ela não sairia com uma brasileira, 50 anos mais nova que
ela.... Ela ainda convidou minha família brasileira para frequentar a casa dela
e a nos levou num restaurante onde fizemos a maior folia... No fim ela me
disse, que foi uma noite linda.
Fico
pensando que muitas vezes nem estamos atento as crenças e discursos que
compramos.... Mas talvez o mais importante não é levar a sério tais palavras,
mas sim, as atitudes. A minha vizinha luxemburguesa é uma das pessoas mais
maravilhosas que conheci.
Espero
trazer uma pequena mudança nas atitudes das pessoas com essa pequena história
da minha relação com Esch... A melhor coisa a se fazer, para aqueles que não gostam de Esch, é vir para cá e ver se realmente esse discurso de que Esch não é um lugar
mágico para se viver é pisando nessa terra e frequentando os locais mais
queridos de Esch.
Alias, o
fato de ter tantos portugueses me deixa contente. Tem um pedacinho de Lisboa,
Porto, Aveiro, Algarve, Braga na minha alimentação, no meu cabelo, nas
conversas do parque, no meu sorriso.
Obrigada
a todos que me mostraram que Esch é um ótimo lugar para se viver!
Beijos e um Feliz Natal!
Cíntia
Beijos e um Feliz Natal!
Cíntia
Para
saber mais sobre a emigração portuguesa:
http://semanariocontacto.blogspot.lu/p/imigracao-lusofona-no-luxemburgo.html
http://semanariocontacto.blogspot.lu/p/imigracao-lusofona-no-luxemburgo.html
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