Existem três
tópicos muito mencionados entre mamães de primeira viagem: sono do bebê, choro
e amamentação.
Para mim,
existiam alguns comportamentos básicos que deviam ser vividos entre mães e
filhos e nunca questionei a “existência deles”: amamentar em primeiro lugar,
amamentar sob demanda do bebê, independente de quantas horas ele acordasse a
noite, apaziguar qualquer choro do bebê.
Esses
comportamentos, não são consenso aqui no país de Luxemburgo.
Eu
participei de um encontro de pais para conversarmos sobre choro e sono do bebê,
na casa de uma doula inglesa muito simpática e querida.
Primeira
pergunta ao se chegar na casa dela foi: Você quer chá? Of
course.
Sentamos
na sala confortável dela. Imaginei-a sentada naquela sala, toda elegante, com a lareira acesa,
lendo um livro e tomando chá às 17h.
Voltei a realidade quando o Benjamin começou
a chorar.
Na
conversa entre os pais, ouvi das mais variadas formas de criarem os filhos. Quase todos
os pais que estavam ali tinham problemas com os bebês nas noites. Eu achei que
eu tinha problemas, mas saí de lá achando que o Benjamin é o grão-duque do
sono.
Uma mãe da
Eslováquia contava com lágrimas nos olhos que seu bebê de 6 meses acorda desde os
3 meses a cada hora na noite. Outra mãe polonesa contou que seu bebê de 7 meses
faz três semanas que acorda a cada 2 horas e ela estava tão acabada que um dia
na madrugada gritou com seu filho. Uma italiana contou que a bebê dela dormia
bem até às 4h da manhã, quando acordava e não queria mais dormir, então ela
passa toda madrugada de 1h a 1h30 fazendo a filha voltar a dormir, um dia ela,
o outro, seu marido.
Uma
inglesa, bem quietinha e sorridente, sem olheiras, com um ar muito sossegado,
disse que sua bebê de 3 meses dorme a noite inteira, até às 7h da manhã no seu
próprio quarto. E o povo:
A inglesa
e a italiana me convidam para um café no dia seguinte com mais duas amigas
holandesas. Claro que eu aceitei! Não perco um encontro de mamães! ADORO! Estou
virando profissional até nisso. O Daniel já perdeu as contas de quantos grupos
eu participo.
Cheguei ao
encontro e lá estavam as duas holandesas e a inglesa, super elegantes, com cútis
de pêssego, olhos brilhando, cabelos lavados e deslizando no vento friozinho de
Luxemburgo.
A italiana, chegou atrasada com um ar de quem não dormiu bem.
Todos nossos
bebês têm 3 meses. Chega aquele momento em que os bebês começam a chorar e todo
mundo presume que é fome então sacam os peitos para fora, menos uma das
holandesas. Eu a olhei, provavelmente com uma cara de “não vai mostrar a teta?”
e ela diz: “Amamentar não é para mim”. Ela conta que tentou por três dias, não gostou
e o seu bebê toma complemento a cada 3 horas.
Em um
certo momento, o bebê dela começou a dar uma reclamadinha, ela olhou no relógio
e disse “hum, ainda não são onze horas”. Conversou com ele e logo ele voltou a
sorrir. Estranhamente, ele era o bebê que menos chorou.
Papo vai,
papo vem, quando finalmente tocamos no assunto sono. Eu perguntei:
- E aí,
como seus bebês dormem?
Elas
(holandesas e inglesa):
- Bem ué,
a noite inteira.
Aí uma
delas:
- Eles
foram treinados (em inglês “They were sleep-trained”).
Na hora
eu pensei “Meu Deus, elas não tem medo de falar isso em voz alta? Elas não tem
medo do julgamento de as outras mães saberem que elas deixaram seus bebês
chorando?”.
E eu:
- Vocês não
tem medo que isso pode causar algum dano aos bebês?
Elas
riram.
- Claro
que não, quanto menores, mais rápido eles aprendem e menor o sofrimento
deles.
Elas
acreditam que é muito importante eles aprenderem a se acalmarem sozinhos, assim
como dormirem sozinhos. Acham que dentre tantas coisas que os pais ensinam,
dormir é uma das coisas difíceis de ensinarem, mas assim como todos os
comportamentos que envolvem “serem independentes” são difíceis de ensinar. Da
mesma forma, acham que o bebê dormindo bem, evita conflitos entre o casal,
entre a mãe e o bebê, diminui a probabilidade de depressão pós parto e facilita
os cuidados e afeto durante o dia. Alias, elas eram muito afetuosas com seus
bebês.
Fiquei
pensando se elas falassem isso numa roda de conversa no Brasil o quanto não iam
ser massacradas. Como tenho uma crise de nacionalidade ouvi aquilo com olhares
de antropóloga...
Depois
falamos de choro. Que é bom saber que outros bebês também choram e que é muito difícil
lidar com o choro deles. Que muitas mães parecem esconder os problemas da
maternidade, como se existisse uma pressão social em que a mãe nunca pode ter
sentimentos negativos em relação aos seus bebês. Por isso, uma foto postadinha
no Face garante que todos acreditem que criar bebês são só flores.
Acho que não
tem um grupo mais julgado socialmente que pais... Talvez professores e homens
quando estão em bares e não bebem cervejas, ou quando estão em clubes e não paqueram
mulheres. O que me deixa mais boquiaberta
é a convicção com que algumas pessoas falam daquilo que é certo ou errado. Acho
que eu e outras mães que conheço, fazemos parte do clube da dúvida. Temos
debates recheados de dúvidas sobre o que realmente é certo ou errado. No fim,
sempre chegamos a conclusão de que comportamentos como deixar chorar, treinar o
sono, amamentar ou não, não é certo ou errado, é cultural e pessoal.
Por isso,
algumas mães vão guardar seus segredos de educação dos filhos a sete chaves, se
aquilo que elas fazem pode ser considerado imoral em seu círculo de amigos. Mesmo
que tenha tido um bom resultado (isto é, criança feliz e saudável!).
É claro
que estou falando de comportamentos que ninguém realmente sabe se a longo prazo
causa danos – como de treino de sono, etc. Amamentar é consenso que é melhor
que Nestlé, mas não quer dizer que os bebês não amamentados serão adultos com
muito mais problemas de saúde, nem sempre.
Voltando de busão para casa com o Ben, ele adora uma sonequinha no busão...
... fiquei pensando
no fato de que a Holanda é um dos países que mais incentiva o parto normal e em
casa, não em hospitais. É o país com menor índice de cesáreas da Europa. As
doulas são muito mais importantes que os médicos e que isso seria motivo de
elogio entre muitas brasileiras.
Mas após
o parto, essas mesmas mulheres que tomaram cuidados para seus bebês nascerem de
uma forma mais natural e tranquila possível, teriam pregas de letra Escarlate
ao anunciar que iniciariam o treino de sono de seus bebês.
Agora
entendo mais esse conceito de “multiculturalidade” que para mim hoje não tem
nada a ver com o papo filosófico da academia, e sim com minha capacidade e dos
meus amigos estrangeiros de aceitar meus comportamentos, apesar de serem
diferentes dos deles, sem sermos julgados (tirando aqueles de direito universal
dos homens, please). Apesar de elas acharem curioso eu “aceitar” acordar a
noite para amamentar, elas não acham que eu deveria parar com isso.
Assim como eu hoje aceito meu amigo inglês ser a favor da monarquia. Foi difícil!
Assim como eu hoje aceito meu amigo inglês ser a favor da monarquia. Foi difícil!